Ayurveda e o Vegetarianismo — Consumo consciente e a ação do karma
Existem alguns equívocos a respeito do vegetarianismo e seu papel na alimentação ayurvédica. Alguns autores sobre o Ayurveda afirmam que essa medicina é baseada no vegetarianismo devido a razões religiosas, ao invés de quaisquer motivos biológicos ou de saúde.
Entretanto, segundo o Charaka Samhita — o mais importante texto do Ayurveda que sobreviveu até os dias de hoje —, existem orientações de consumo para alimentos vegetais e animais.
Ayurveda e o vegetarianismo, qual a relação?
A literatura Charaka Samhita não declara ou recomenda a alimentação constante da carne. Pelo contrário, afirma que a carne se mostra nutritiva apenas para o alívio de certas doenças ou quando o indivíduo se encontra desidratado, fraco, muito magro ou convalescente.
O texto também menciona que a carne é “prejudicial” quando se trata de um animal que foi criado em um habitat que não o seu ambiente natural, ou em áreas não nativas. A carne do animal se torna tóxica a partir do momento em que ele se alimenta de elementos que não fazem parte da sua dieta natural ou não provém de seu ambiente normal.
É claro que a carne, da forma como é preparada hoje em dia, não atende a essas diretrizes para uma alimentação saudável — e não somente segundo o Ayurveda. Além disso, biologicamente os serem humanos estão mais adequados a uma dieta predominantemente vegetariana.
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Digestão e acúmulo de toxinas
É de conhecimento geral que a carne não é um alimento facilmente digerível e, segundo o Ayurveda, o longo processo digestivo frequentemente leva à formação de toxinas fisiológicas ou emocionais (chamadas de ama).
Quando acumuladas, essas toxinas podem produzir inúmeros problemas de saúde, como pedras nos rins, gota, cálculos biliares e reumatismo. Isso acontece porque Agni, seu fogo digestivo, não é capaz de digerir e eliminar as toxinas do organismo.
Dr. Bernard Jensen, um renomado nutricionista Norte-Americano, expressa claramente esse conceito quando diz que “proteínas animais apodrecem muito rapidamente no trato intestinal, e é por isso que devemos ter cuidado com esses alimentos. Subprodutos com proteína tóxica podem encontrar o caminho para a corrente sanguínea, onde causam muitos problemas”.
O Ayurveda atribui uma importância fundamental aos alimentos e hábitos alimentares à manutenção de uma boa saúde. Comida é vida! Os textos indianos antigos estão repletos de exemplos onde o Ayurveda é colocada sobre um alto patamar na hora de estabelecer uma dieta, curar doenças e manter a saúde impecável.
Eles enfatizam a comida vegetariana, que é denominada sáttvica. Essa é a categoria mais desejável para o consumo humano dentre as três para as quais o Ayurveda designa todos os alimentos. Os outros “Gunas”, como são chamadas essas três tendências, contêm os alimentos rajásicos e tamásicos.
O consumo regular de alimentos sáttvicos ajuda a prevenir doenças e a manter uma boa saúde física, mental e espiritual. Alimentar-se desse cardápio e praticar um estilo de vida sáttvico é a melhor medicina preventiva que se pode aderir.
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Pode ou não pode ingerir carne?
Segundos os aconselhamentos originais do Ayurveda, uma dieta deve ser puramente vegetariana. No entanto, ao longo dos milênios em que essa medicina existe, o papel do vegetarianismo no Ayurveda sofreu algumas modificações.
Alguns autores chegaram a defender o consumo em suas diretrizes alimentares, ou passaram a defender que pessoas com a constituição Vata precisem das proteínas de origem animal.
Outros especialistas afirmam que o Ayurveda é baseado no vegetarianismo por questões religiosas e espirituais, sendo os benefícios biológicos uma consequência.
A verdade é que comer carne foi sim um dado incluído nos textos ayurvédicos originais, ainda que em porcentagens muito pequenas. Mas para que esse consumo aconteça e o alimento seja “aceito”, existe uma série de ressalvas.
A primeira regra para que a carne possa vir para à mesa é que a mesma deve ser obtida utilizando métodos tradicionais de caça. Além disso, o animal a ser caçado precisa ter vivido em seu habitat nativo e de forma natural.
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O perigo cármico do consumo da carne
Além dos textos ayurvédicos sobre o assunto, a literatura védica explica em termos claros que existe um perigo cármico em consumir carne e, principalmente, em tirar a vida de animais desnecessariamente.
Segundo o “Código de Manu” (coleção de livros bramânicos que consiste na legislação do mundo indiano), encontramos trechos claros como: “a carne jamais pode ser obtida sem ferir outras criaturas vivas, e ferir outros seres sencientes é danoso à obtenção da bem-aventurança celeste. Portanto, que haja abstenção do consumo de carne. Tendo considerado bem a origem repulsiva da carne e a crueldade envolvida em prender e matar seres corpóreos, que haja completa abstenção do consumo de carne”.
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As consequências do Karma
Para aqueles que auxiliam no processo de abate ou tratamento de animais confinados, diz-se que também existem consequências cármicas. No Manu-samhita 5.51-52, você encontrará o seguinte texto:
“Aquele que permite o abate de um animal, aquele que o corta, aquele que o mata, aquele que compra ou vende a carne, aquele que a cozinha, aquele que a serve e aquele que a come devem ser todos considerados os próprios matadores do animal. Não há pecador maior do que aquele que, em vez de tentar crescer através da adoração aos deuses e aos antepassados, o faz através da carne de outros seres”.
Ainda segundo o Manu-samhita (5.37-38 e 5.45), há uma previsão para as próximas vidas de um consumidor da carne sem motivo legítimo. A experiência de mortes violentas em nascimentos futuros ou ainda a impossibilidade de encontrar a felicidade (nesta vida ou na próxima) são algumas das consequências para quem fere animais inofensivos com o desejo de conferir prazer a si mesmo. Você pode encontrar todos os trechos citados e outros associados ao consumo da carne clicando aqui (em inglês).
Neste e em outras literaturas hindus, não há dúvida de que o shastra, ou preceito védico, recomende o abandono do consumo da carne baseado no egoísmo e no prazer da língua. É preciso se abster dessa atividade caso tenha alguma preocupação não somente com outros seres vivos, mas com a própria existência futura ou com a obtenção de méritos espirituais.
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