A consciência cósmica nas crianças
Sabemos que as crianças estão mais conectadas com a espiritualidade durante a infância, e essa conexão vai ficando menos intensa conforme a criança cresce. Mas não é bem sobre espiritualidade que vamos tratar nesse artigo. É sobre consciência cósmica, sobre a noção de fraternidade e da cidadania universal.
“Somos todos viajantes de uma jornada cósmica – poeira de estrelas, girando e dançando nos torvelinhos e redemoinhos do infinito. A vida é eterna. Mas suas expressões são efêmeras, momentâneas, transitórias”
E essas crianças que expressam de maneira mais natural essa sabedoria universal estão vindo em cada vez maior número para a Terra. E porquê? Porque estamos passando por uma transição, e essas consciências mais evoluídas vieram ajudar no despertar coletivo da humanidade.
Vamos falar sobre a consciência cósmica nas crianças?
O que é consciência cósmica?
Consciência cósmica é um conceito muito antigo, presente em quase todas as culturas e religiões. Mesmo as narrativas metafísicas mais amarradas em dogmas têm, misturado ao seu conjunto de crenças, noções da consciência cósmica universal. No entanto, foi a partir do século passado que a consciência cósmica deixou de ser somente um conceito para virar também experiência, recebendo atenção inclusive da ciência. A Psicologia Transcendental, por exemplo, é uma área da psicologia especializada no estudo dos estados de consciência, especialmente dos estados “ampliados” de consciência. E vemos que essa disciplina recebeu muita influência do pensamento tradicional, como o behaviorismo, gestalt e psicanálise, como também das sabedorias orientais e metafísicas como a yoga, o zen budismo e o sufismo. É o encontro entre a ciência e a consciência espiritual humana.
“A consciência é o melhor livro de moral e o que menos se consulta”
Voltando ao conceito de consciência cósmica, podemos dizer que esse conceito transcende a consciência humana que é estabelecida pela cultura, pelos padrões morais e pelos sentidos do corpo. Essa consciência é limitada pela própria experiência material, e permeada pelas limitações culturais de cada região. Já a consciência cósmica é algo que todo espírito, independente da sua cultura ou religião, traz dentro de si. Dependendo da tradição, a consciência cósmica recebe nomes diferentes: êxtase místico, experiência cósmica, experiência transcendental, Nirvana, Samadhi, Satori, Reino do Céu, etc. Ela é uma forma de consciência mais elevada e espiritualizada, que permite uma tomada de consciência sobre a essência espiritual humana e a dimensão dessa essência na matéria e nas relações que estabelecemos uns com os outros.
Richard Maurice Bucke, um psiquiatra canadense do final do séc. XIX, foi o responsável por nomear essas sensações e experiências transcendentais como consciência cósmica. E foi a partir de uma experiência pessoal que ele percebeu que todos nós tínhamos essa outra consciência, um estado expandido da nossa mente, conforme ele descreve em seu livro Cosmic Consciousness. Aos 35 anos de idade, Richard teve sua vida mudada para sempre; após passar a noite em companhia de alguns amigos, quando ele estava voltando para casa se sentiu como que envolto numa nuvem cor de fogo. Segundo ele, essa luz vinha do seu próprio interior. Logo depois, ele foi tomado por uma sensação imensa de felicidade, que veio acompanhada de uma iluminação intelectual indescritível, através da qual ele conseguia compreender o mundo inteiro e se sentir parte integrante desse “todo” que existe.
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Quais são os tipos de consciência?
Apesar de ter durado pouco segundos, esses instantes de iluminação que Richard vivenciou deram a ele uma compreensão brutal sobre a condição humana e a consciência. Ele então construiu uma classificação da consciência para tentar explicar o mecanismo físico que oculta a nossa verdadeira essência, e também para mostrar um caminho para que as pessoas consigam acessar esses estados consciências mais expandidos.
“O que é necessário para mudar uma pessoa é mudar sua consciência de si mesma”
Para começar, segundo Richard nós temos uma consciência simples, que é comum entre os homens e os animais e não possui nenhuma complexidade. Ela guarda os instintos e sensações primitivas transmitidas pela evolução das espécies ao longo dos anos. Logo depois, ele nomeou como segunda instância da consciência como sendo a autoconsciência, a principal diferença entre os homens e os animais. É ela que dá ao ser humano a noção de si mesmo como uma entidade distinta, separada do restante do universo. E, por meio dela, pode tratar seus próprios estados mentais como objetos de consciência. Por fim, temos um terceiro estado consciencial que Richard chamou de consciência cósmica. Nela, ocorre uma iluminação intelectual e moral que eleva o ser humano a um novo plano de existência, entendido por Richard como o próximo passo da evolução humana. É através dela que o homem acessa sua dimensão espiritual, sua condição eterna de existência e a característica da existência como mecanismo de desenvolvimento espiritual. Quanto mais nos conhecemos, mais profundamente adentramos nesse terceiro estado consciencial, mais conhecimento e sabedoria acumulamos e mais iluminados nos tornamos.
As crianças e a consciência cósmica
Pois bem. Uma criança não possui sequer repertório para compreender o que significa consciência, nem muito menos para descrever e compartilhar experiências consideradas mais espirituais. Porém, a consciência cósmica se manifesta nas crianças de uma outra forma. Sabe aquelas crianças que parecem que já nasceram sabendo? Elas aparentam ter uma sabedoria que causa espanto nos adultos. Elas simplesmente ensinam mais do que aprendem. Claro que os adultos vão ensinar para essas crianças como falar, como andar, como comer, como fazer sua higiene, alguma noção sobre ética e relacionamento, mas nada além disso. De resto, são elas que mostram aos pais os caminhos da iluminação espiritual e trabalham neles suas fraquezas e dificuldades.
“A prisão não são as grades, e a liberdade não é a rua; existem homens presos na rua e livres na prisão. É uma questão de consciência”
Um ponto bastante interessante em se observar é que as crianças, por exemplo, não nascem preconceituosas. Essa consciência cósmica dá a elas o entendimento sobre o que é fraternidade e da conexão espiritual que une todos nós. A criança não enxerga o mundo através das diferenças, mas sim do amor e da união. Uma criança não sabe o que é um negro, um velho, um mendigo. A criança vê pessoas, e gosta delas ou não na medida da relação que estabelece com elas e o que recebe dessas pessoas.
A deficiência, por exemplo, também não é um problema para as crianças, que muitas vezes nem percebem que o amiguinho na escola possui alguma necessidade especial. Com uma inocência comovente, elas simplesmente se aproximam e brincam com a outra criança, sem fazer muitas perguntas. E, quando fazem, é por pura curiosidade e desejo de conhecer o diferente, jamais de discriminar o diferente. Quando vemos uma criança que foge a esse padrão, é porque ela já foi doutrinada pela família e está refletindo na rua comportamentos que ela aprendeu em casa, com seus pais. Uma criança pequena não é homofóbica, os pais dela é que são. Uma criança não é racista, os pais é que são mesquinhos e ignorantes.
A criança possui um senso de amor incondicional muito forte, pois essa é a maior manifestação da consciência cósmica. E ela consegue facilmente estender essa habilidade de amar para os animais e para as plantas, vendo com o mesmo amor tudo que existe no mundo. Na verdade, é o mundo que ela vê com os olhos do coração. Uma criança é empática e solidária com tudo que é externo a ela. Infelizmente, é educação que damos a elas que vai matando, aos poucos, essas características de uma espiritualidade mais elevada, que vai sendo substituída pelos valores materiais, pelo ego, dogmas religiosos e tabus sociais. E esse processo acontece rapidamente, em alguns casos ainda na infância, mas em outros a evangelização material começa a ter efeito somente na adolescência e no início da fase adulta.
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Como manter essa consciência na criação dos filhos?
Essa é uma dúvida que cada vez mais pais estão tendo, uma vez que eles mesmos estão despertando suas consciências para a verdadeira espiritualidade. Vemos, ao longo da história, que a criança sequer era uma entidade até a metade do século passado. Não havia infância, as crianças não recebiam atenção como hoje e não tinham voz e vontades como tem hoje. Também não haviam brinquedos e nem tecnologia, e a educação infantil não era uma prioridade. Um adolescente, nos séculos passados, já era um adulto. Uma menina logo após a primeira menstruação já poderia se casar, enquanto que um menino por volta de seus 13 ou 14 anos já trabalhava e era considerado um homem. O conceito de infância e o amor que dedicamos aos pequenos é uma novidade da modernidade e aparece somente após o romantismo.
Pois bem. Para manter essa pureza infantil e alimentar os comportamentos que têm origem nesse lugar da consciência cósmica e da sabedoria universal, a primeira coisa que deve ser feita é estabelecer uma relação de liberdade entre os educadores e seus filhos. Devemos orientar, não impor. A começar pela religião, uma das grandes vilãs que implode qualquer pensamento mais espiritualizado. Podemos, é claro, ensinar às crianças uma determinada religião ou outra, mas nunca devemos incutir nelas a ideia de que só existe um caminho e que somente aquela religião é correta. Devemos, inclusive, apresentar possibilidades e fazer do diálogo o mecanismo da parentalidade. Também não é preciso dizer que qualquer forma de discriminação ou preconceito são contrários às leis divinas, portanto, são noções opostas ao pensamento cósmico e espiritual.
“A religião do futuro será cósmica e transcenderá um Deus pessoal, evitando os dogmas e a teologia”
Liberdade é o segredo. Quando iniciamos o processo de libertação, rompemos a máscara das ilusões culturais, transmitidas de geração para geração e iniciamos um fluxo de aprendizado mais verdadeiro e voltado para valores superiores. Talvez, a julgar pela forma como criamos as nossas crianças até hoje (e o mundo que elas constroem depois disso), não fosse necessária muita participação nossa. Talvez sejam os próprios adultos que estão estragando as crianças e matando a consciência cósmica nata dessas criaturas. Elas já vivem em um estado de alegria plena, expressam suas emoções sem nenhuma vergonha, perdoam de forma muito mais natural que um adulto e amam também de forma mais intensa e incondicional. E não são esses os valores que buscamos? Damos toda uma volta, construímos alicerces que achamos que estão nos conduzindo para a transcendência, mas que, na verdade, estão impedindo nosso crescimento e fazendo do mundo um lugar de tanto sofrimento e morte. Nós é que não somos capazes de perceber que as crianças já encarnam em um modo preliminar do estado de consciência cósmica, que tanto buscamos. As crianças estão, de fato, em um estado de iluminação primordial que é perdido pela nuvem de esquecimento e valores materiais transmitidos por nós, seres não despertos. E é esse processo que mantém a ilusão viva, que faz da matéria essa matrix que só oferece o que é falso, transitório e vazio. É por isso que o mundo não muda nunca. Evoluímos em tecnologia, mas nossos progressos morais ainda são tímidos.
Tudo o que proporcionar uma educação liberta, que não seja uma instância de uma contínua intervenção destrutiva que inibe o que está latente na estrutura psíquica de qualquer criança, é uma maneira de preservar a consciência cósmica infantil.
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