Coronavírus é um mensageiro?
Existe essa ideia de que o coronavírus é um mensageiro que carrega uma grande lição para a humanidade, tem circulado bastante nas redes. Alguns alegam que ele é uma praga divina, outros dizem que Jesus está voltando e há quem espere pelo fim dos tempos. Será mesmo? Enquanto tentamos buscar justificativas e respostas fora da nossa própria realidade, a verdadeira mensagem dessa pandemia fica incompreendida.
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Qual é a mensagem do coronavírus? O coronavírus é um mensageiro?
A origem do vírus
Primeiro é importante dizer que mais de 70% das doenças virais que surgem em humanos são zoonoses, infecções que são transmitidas ao homem por animais. É o caso do Ebola, Vírus do oeste do Nilo, SARS, Mers, Gripe Suína, Gripe Aviária e agora o coronavírus. São milhares de vírus catalogados e milhões que nem sequer conhecemos. A natureza é um viveiro desse tipo de organismo e o que aconteceu na China pode acontecer em qualquer outro lugar. Essa é uma questão que a ciência tenta alertar a tempos e uma pandemia causada por um vírus respiratório já era esperada. A pergunta dos cientistas não era “se vai acontecer”, mas sim “quando vai acontecer”. E agora está acontecendo e arrisco dizer que esta não será a última pandemia que veremos.
“Só sei que nada sei”
Retirando do contexto as teorias da conspiração, sabemos através da ciência que esse vírus passou dos animais para humanos em um mercado em Wuhan, na China. Alguns culpam a cultura alimentícia chinesa, mas não é bem essa a razão que faz com que um vírus salte de uma espécie para outra. Essa transmissão tem muito mais a ver com o abate de animais vivos, que ficam misturados com animais mortos, em um ambiente com péssimas condições sanitárias. O que acontece em muitos países ao redor do mundo.
A questão é: esse vírus é uma questão orgânica, no sentido de que foram os hábitos humanos que fizeram com que esse coronavírus encontrasse seu caminho para o mundo. A China não é a única que mantém uma relação cruel com os animais. Todos nós temos. No Brasil, por exemplo, comemos tatú, gato, olho de peixe, sambiquira (porção terminal do corpo das aves no formato de um apêndice triangular), cotia, pombo, capivara, rato, gambá… A maioria de nós está acostumada a comer animais como vaca, boi, porco e frango, contudo, se você for a restaurantes um pouco diferentes ou viajar entre diversas regiões do Brasil, vai se deparar com animais bem fora do padrão nos cardápios regionais. A diferença é que nós, ocidentais, gostamos de pensar que a vaquinha e os porcos podem ser comidos, e que um cachorro não pode. O que nós comemos é aceitável e o que outras culturas comem, não. Nesse sentido, a origem do coronavírus pouco importa. O que devemos prestar atenção nesse caso, é na primeira lição que ele nos ensina: a nossa relação com a natureza pode acabar com a vida na Terra. Quanto mais exploramos os animais, quanto mais invadimos o espaço deles na natureza, mais estamos nos expondo a uma contaminação não só viral, mas também bacteriana. São os nossos hábitos enquanto sociedade que resultam em grandes pandemias. Não é um castigo de Deus, uma mensagem divina, um ataque biológico É só o resultado de nossas ações, embora ele traga mensagens muito claras. Essa é a origem do vírus: nosso estilo de vida.
Um mensageiro de Deus?
Deus não interfere dessa forma na Terra. Talvez o deus bíblico sim, esse manda pragas e se vinga dos homens, mas sabemos que aí entramos no campo da religião. E cada uma conta sua história e faz questão de deixar claro que nenhuma outra prega a verdade. Mas quem estuda a espiritualidade e não se apega a uma única narrativa, entende melhor que um Deus vingativo, ressentido e autoritário não tem muito sentido.
O que acontece é que Ele se expressa através de leis naturais como a Lei do Retorno, por exemplo. É o sistema criado por Deus que nos permite aprender através dos nossos próprios erros, colhendo os frutos daquilo que plantamos. Nesse sentido, tudo é uma mensagem de Deus.
“Ele sabe o que há na terra e no mar; e não cai uma folha sem que Ele disso tenha ciência”
Tudo que acontece aqui tem um propósito. E é por isso que nunca fomos socorridos em situações muito piores. E todas foram causadas por nós, todas foram consequências de decisões que tomamos, embora a gente sempre tente colocar a culpa no inimigo. Nesse momento é a China, mas no passado foram outras regiões. Na época da Peste Negra, por exemplo, achava-se que a doença era fruto do envenenamento de poços feito por judeus, o que levou a muitos massacres e muita morte. Encontrar um culpado para algo que é biológico e natural só mostra o quanto somos ignorantes e preconceituosos. Mais uma mensagem do coronavírus que está sendo muito mal compreendida… O que devemos entender é que, seja o vírus criado em laboratório, uma praga enviada por Deus ou um golpe comunista, é através dos efeitos que ele tem no mundo que devemos entender a mensagem que ele carrega.
Esqueça o mensageiro, foque na mensagem
Achar que o coronavírus é um mensageiro pode ser um pouco exagerado, uma ideia que nasce da necessidade que temos de dar sentido ao que nos acontece. É mais fácil encarar dessa forma do que tentar repensar o que foi que fizemos que resultou em uma pandemia tão grave. Quando tentamos dar uma interpretação mais espiritual, repare que a ideia nunca fica centrada em nós e se dilui no todo. É culpa “deles”, “alguém errou” que não sou eu. Deus está triste com o homem, mas não comigo. Eu não tenho nada a ver com isso. São pessoas que se sentem espectadoras dos acontecimentos, e são essas mesmas pessoas que vão tentar achar um culpado para o que aconteceu e passar pela situação com um total de zero reflexão.
Mas a mensagem não é essa. A mensagem é para toda a sociedade e não tem nada de espiritual. Na verdade até tem, no sentido de que aqueles que possuem “olhos de ver”, conseguem enxergar a mensagem com mais facilidade. É fácil perceber que a nossa economia é tão frágil que não resiste a 3 meses de gripe. Também não é difícil sacar que, foi tentando proteger ela, que muitos países demoraram para tomar medidas contra o contágio e agora amargam milhares de mortes. Então vemos nascer em alguns países teorias conspiratórias que jogam a culpa na China, embora ela tenha avisado o mundo em janeiro. Tomou providências quem quis. Quem decidiu apostar na economia, se deu mal.
Também vemos que conter o vírus exige a cooperação não só entre pessoas, mas entre nações. Sem a ajuda de outros países, com as economias altamente entrelaçadas, ninguém vai conseguir sair dessa. Falta dinheiro e principalmente recursos. Todos precisam de máscaras, respiradores, roupas de proteção e medicamentos. Também vemos que alguns países oferecem ajuda, enquanto outros confiscam material. Quem queria construir muros, foi obrigado a construir pontes. Quem sempre ajudou, agora pede ajuda.
Está bem clara a mensagem e ela escancara o que há de pior no mundo. Ela evidencia a urgente necessidade de transformação, mostra como a sociedade promove a pobreza e o quanto ela é inaceitável em termos humanos e sanitários. Ela mostra como territórios inteiros recebem mais atenção, enquanto outros sequer vão conseguir enterrar seus mortos. Europa sempre em evidência, nos entristecemos com a situação nos Estados Unidos, mas poucos procuram saber sobre o que está acontecendo na África. Se o mundo se mobilizasse com a mesma vontade e rapidez em que angariou milhões para restaurar a Notre Dame, o combate ao coronavírus iria custar muito menos vidas e dinheiro aos cofres públicos e caixas privados. Mas é justamente tentando manter essa sociedade, proteger esse sistema, que ainda estamos discutindo em um país imenso como o Brasil (cheio de favelas também) se a quarenta é eficaz ou não. Se vale parar por causa de 5 ou 6 mil pessoas que podem morrer no país, como disse Junior Durski, dono do Madero, uma rede de restaurantes com mais de oito mil funcionários.
“A serenidade espiritual é o fruto máximo da justiça”
Talvez a mensagem do coronavírus seja que devemos combater o pensamento de pessoas como Junior Durski para trazer valores mais humanos para a nossa sociedade. Qualquer resposta que fuja desse contexto passa longe da compreensão do que está acontecendo na realidade, seja ela material ou espiritual. Crise é sempre uma mudança, uma oportunidade. Resta saber qual rumo vamos tomar, o quanto dessa “mensagem” vamos reter.
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