O Efeito Zeigarnik: o episódio termina, mas a história não
O nosso cérebro retém melhor as tarefas interrompidas e inacabadas, do que as que já foram finalizadas. Seja um garçom que memoriza um pedido longo que ainda não pago (mas que esquece automaticamente assim que o cliente sai), um pedido complexo de um cliente que ainda não foi entregue ou aquele final de episódio tenso de uma série de televisão que deixa o telespectador sem saber o que vai acontecer em seguida: as atividades e os assuntos ficam mais na nossa mente até que sejam concluídos.
O efeito Zeigarnik e as coisas pela metade
Esse efeito foi estudado e descoberto pela psicóloga russa Bluma Wulfovna Zeigarnik (1900 – 1988), membro da Escola de Psicologia Experimental de Berlim e do Círculo Vygotsky. Ela observou o efeito da interrupção no processamento da memória em 1927, enquanto estudava na Universidade de Berlim.
Tudo começou quando o seu professor, Kurt Lewin, notou como os garçons num café só se lembravam dos pedidos enquanto esses estivessem em processo de serem servidos. Eles pareciam lembrar-se dos pedidos não finalizados de forma mais eficiente do que as que tinham sido pagos. Isto parecia sugerir que a mera conclusão de uma tarefa pode levar a que a mesma seja esquecida, enquanto tarefas incompletas, tais como servir os pedidos de clientes que ainda não tinham terminado a sua refeição, ajudavam a garantir que o empregado de mesa se lembrasse do pedido.
Bluma Zeigarnik realizou então um estudo sobre memória, no qual comparou a memória em relação a tarefas incompletas e completas, levando ao que hoje conhecemos como o efeito Zeigarnik.
Zeigarnik decidiu testar esta hipótese num ambiente experimental, e publicou as suas conclusões em “On Finished and Unfinished Tasks” (Sobre Tarefas Terminadas e Não Terminadas) em 1927. Na experiência, pediu a cada participante que completasse uma série de tarefas separadas, tais como resolver um quebra-cabeça ou montar uma embalagem. Durante cerca de metade das tarefas, os participantes foram sutilmente interrompidos pelo supervisor da experiência, enquanto durante a outra metade, lhes foi concedido o tempo necessário para as completa-las sem interrupções.
Após a experiência, Zeigarnik entrevistou cada participante, pedindo-lhes que se lembrassem dos detalhes de cada tarefa que tinham tentado realizar. Os resultados foram surpreendentes, revelando que os participantes foram capazes de recordar detalhes de tarefas interrompidas cerca de 90% melhor do que aquelas que tinham sido capazes de completar sem serem perturbados. Isso sugere que o desejo de concluir uma tarefa pode causar a sua retenção na memória de uma pessoa até à sua conclusão, e que a finalização da tarefa permite o processo de esquecimento.
Como memorizamos melhor as atividades incompletas
Quando temos várias coisas na nossa memória de curto prazo, precisamos lembra-las continuamente, caso contrário elas desapareceriam. Isto exige muito esforço cognitivo, e quanto mais coisas temos em mente, maior é o esforço.
Por isso o nosso cérebro normalmente usa estratégias, ou melhor, nós usamos estratégias para o nosso cérebro nos lembrar apenas das coisas que estão incompletas. Os garçons lembravam melhor dos pedidos ainda não pagos. No entanto, após a conclusão da tarefa – depois de todos terem pago a conta – eles esqueciam os detalhes dos pedidos.
Para além de um efeito a curto prazo, isto também acontece durante um período mais longo, pois nos preocupamos com as nossas tarefas inacabadas. Por exemplo, um programador vai pensar no bug não resolvido no seu código durante um fim-de-semana inteiro, pois ele vai continuar voltando à sua mente para assombrá-lo e lembra-lo de resolver na segunda-feira.
Esse efeito vira um truque que é muito bem aplicado por novelas e seriados. O episódio termina, mas a história não. Assim, o telespectador fica preso na expectativa.
O Efeito Zeigarnik para aumentar a produtividade no trabalho
Todos conhecem o que é ter uma lista de tarefas e ver algumas delas ficando para trás. Outras tarefas vão sendo finalizadas, mas aquelas que requerem mais trabalho acabam sendo postergadas.
Quando se tem muito trabalho, geralmente não queremos começar pelas que consomem muito tempo e energia. Muitas vezes nem sabemos por onde começar. Felizmente hoje existem muitas técnicas para lidar com a procrastinação, e muitas delas usam o Efeito Zeigarnik para criar mecanismos que ajudam a dominá-la.
Como então usar e controlar o Efeito Zeigarnik para lidar com a procrastinação?
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Anote todas as tarefas que devem ser feitas. Se a sua mente continua a revisitar algo que ainda não completou, isso vai criar uma distração das tarefas atuais e pode causar ansiedade. Para o evitar, basta escrever tudo o que precisa fazer e também quando e como vai fazer.
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Se estiver procrastinando sem motivação para começar a trabalhar num grande projeto, basta dividir o mesmo em pequenas partes, dar o primeiro passo e completar pelo menos uma parte do mesmo. O seu cérebro irá lembrar-se desta tarefa e sentirá a necessidade de voltar a ela novamente, indo mais longe até que todo o projeto esteja concluído.
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Divida as tarefas mais demoradas e incômodas em várias partes, para que se sinta mais motivado a avançar para o próximo passo, completando toda a tarefa. Uma vez cumpridos os seus objetivos a curto prazo, a sua confiança e autoestima aumentarão. Mesmo que ainda não tenha completado toda a tarefa, você saberá que se aproximou mais do seu objetivo principal.
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O efeito Zeigarnik também pode ajudar a desenvolver bons hábitos que ajudarão globalmente na sua performance profissional. Por exemplo, se quiser começar a correr de manhã, mas não tiver motivação, corra menos do que o que você planejou. É melhor do que não correr nada, e isto vai fazer você querer tentar de novo.
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Para reter melhor as informações que você estuda, interrompa o processo. Por exemplo, comece a ler algum artigo e interrompa-se, pensando em outra coisa durante alguns minutos. Depois disto, regresse ao artigo. Dessa forma você recordará de mais detalhes.
De uma maneira geral, como as tarefas inacabadas continuam a surgir na nossa mente até que as completemos, uma estratégia é dividir essas grandes tarefas em partes menores para que o nosso cérebro pense constantemente nelas até que sejam concluídas, aumentando a sua produtividade e eficiência.
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