Entrevista com Wilsom Moura
Entrevista com autor convidado WeMystic: Wilsom Moura
Wilsom Moura
Engenharia de vida: projetando mentes de clara visão
Propósitos, mentalidade de crescimento, controle e expansão consciente da mente. Em meio a planejamentos estratégicos de vida, autoavaliações e aprimoramentos constantes, podemos desenvolver uma filosofia de vida focada em fazer as coisas certas, do jeito certo, no momento adequado. Strategic thinker, mentor, palestrante, astrólogo e escritor, Wilsom Moura nos apresenta novos conceitos — e desmistifica caminhos delusórios — a respeito do desenvolvimento humano e das mais diversas manifestações de inteligência e de pacificação da mente.
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De engenheiro mecânico a engenheiro da vida. Qual foi o grande momento de virada na sua trajetória, em que o senhor percebeu que existia um interesse e vocação latentes pelo cuidado da mente, do comportamento e do desenvolvimento humanos?
Foi em 1992, ao visitar o templo budista de Borobudur na ilha de Java, Indonésia. Tive uma conexão espiritual muito forte, uma espécie de conscientização que me direcionou a pesquisar mais intensamente os mistérios da mente e suas nuances.
A palavra da moda é “independência, ser independente”, como se isso fosse possível. Precisamos focar a autonomia, nunca a independência.
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A espiritualidade sempre foi um aspecto presente na sua jornada? Ou foi um tópico que precisou ser explorado e trabalhado para além das influências familiares e sociais?
A espiritualidade sempre foi um fator presente na minha família, porém num contexto não intelectualizado. A partir dos 35 anos, comecei a buscar caminhos alternativos visando alcançar respostas até então ocultas. Comecei a estudar Teosofia, assim como os ensinamentos do Agni Yoga e a obra de Alice A. Bailey e o Mestre Tibetano. Posteriormente, resolvi especializar-me na filosofia budista, tradição tibetana, realizando vários cursos e treinamentos intensivos no Nepal e na Índia.
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Em mais de duas décadas de experiência nos campos espiritual e comportamental, quais são as principais queixas que o senhor recebe nos seus atendimentos e mentorias? É possível observar uma alteração de padrões conforme novas gerações entram em contato com diferentes filosofias de vida?
Esta é uma ótima pergunta. Existem muitas queixas, contudo a maioria delas são baseadas nos outros, “culpados pelos meus problemas”. De fato, há uma forte ausência de consciência sobre as regras da natureza, como a interdependência dos fenômenos, karma e seu mecanismo de causas, circunstâncias e consequências automáticas, gerando uma grande irresponsabilidade individual e coletiva. A palavra da moda é “independência, ser independente”, como se isso fosse possível. Precisamos focar a autonomia, nunca a independência. São duas coisas distintas.
Nesse sentido, vemos a falta de compaixão e discernimento que se fazem presentes em larga escala, numa espécie de vitimização coletiva. Na realidade, “eu ataco para me proteger”, tal qual uma cobra, numa distribuição gratuita de ódio e insegurança constante. Acho que não estamos vivenciando diferentes filosofias de vida, pois não há consciência e discernimento, portanto não há um pensamento direcionado e profundo. Vivenciamos, sim, uma espécie de caos coletivo, onde a regra é “cada um por si, todos por mim”, numa inversão de valores, na direção contrária ao “Um por todos, todos por um”, do famoso romance escrito por Alexandre Dumas. Tenho esperança de que a geração Alpha, nascida a partir de 2010, possa mudar os conceitos práticos de qualidade de vida, direcionando-os à equanimidade social e a paz interior.
Quanto mais nos apegamos aos conceitos e julgamentos, menos livres estamos, menos criatividade geramos, mais afastados ficamos da pacificação da mente.
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Hoje em dia, as pessoas estão realmente mais interessadas em rever seus estilos de vida, seus propósitos? A chave está “virando” mais cedo para um despertar da consciência? Como o senhor enxerga esse cenário atual?
Eu adoro uma expressão que diz “ou aprendemos pela consciência ou pela consequência”. Se formos analisar com carinho o nível de qualidade de vida dentre as 193 nações constituídas na ONU, vamos observar que não conseguiremos encontrar mais de 20 países com condições de vida decentes, ou seja, níveis dignos de distribuição de renda, saúde, sistemas educacionais, etc. Atualmente, apenas 1% da população detém 82% da riqueza mundial. É um dado estarrecedor! Os níveis globais de fome, pobreza, educação e saúde são alarmantes, apesar dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável propostos pela ONU. Esse cenário nos leva a crer que estamos aprendendo pela consequência, infelizmente, se é que estamos aprendendo algo. Aliás, um dos grandes equívocos da sociedade é que tudo está à venda, inclusive os valores.
Contudo, como diz Mestre El Morya “Benditos sejam os obstáculos, pois ninguém sobe em pedra lisa”. Precisamos nos conscientizar das nossas fraquezas e desenvolver cenários evolutivos. Isso faz parte do processo, afinal estamos nos direcionando para a Era de Aquários, com preceitos mais humanistas. Caso não consigamos entender nossos graves equívocos, a raça humana fracassará.
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Até em que ponto a espiritualidade pode influenciar no processo de ressignificação dos projetos de vida? Como funciona a sua abordagem com clientes céticos ou que frequentemente associam o plano espiritual à religiosidade?
Primeiramente, necessitamos nos conscientizar sobre os conceitos de espiritualidade e religiosidade. Costumo definir a espiritualidade como é a capacidade de agir em paz, o nível de liberdade que se obtém em relação às próprias percepções. Quanto mais nos apegamos aos conceitos e julgamentos, menos livres estamos, menos criatividade geramos, mais afastados ficamos da pacificação da mente. Já a religiosidade consubstancia-se em dogmas, em crenças religiosas que nem sempre nos conectam com estados de elevação mental, gerando variadas delusões.
Muitas vezes, deturpa-se o seu significado derivado do latim religare, que significa religar, ou seja, religar o ser humano a Deus. Acontece que surgem interpretações diferentes do “Deus”, com muitas questões tendenciosas, produzindo segregações e aprisionamentos, num caminho oposto ao espiritual. Logo, para praticarmos a espiritualidade, não precisamos da religiosidade, o que não quer dizer que não seja possível. Tudo depende de como entendemos as coisas e as praticamos.
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Uma das qualidades amplamente exercitadas em suas metodologias e mentorias é o desenvolvimento da inteligência situacional, um termo relativamente novo, geralmente direcionado ao meio empresarial. No que consiste essa inteligência? Ela pode também ser aplicada à vida cotidiana, como relacionamentos ou mesmo práticas de bem-estar?
Inteligência situacional é a competência de observar e colocar-se na intenção de entender os fenômenos ao nosso redor, visando traçar estratégias de otimização pessoal e profissional. Neste contexto, podemos elaborar um projeto de vida e delinear uma nova ideologia (crenças, intenções e valores), como filosofia de vida. Eu a utilizo unindo as ferramentas da meditação e do planejamento estratégico, inseridas em diversos critérios, dentre os quais a coerência de ações, qualidade dos nossos relacionamentos, objetivos futuros e a saúde física e mental.
Estamos produzindo uma sociedade tecnicamente avançada e moderna, com mentes tecnicamente dispersas e altamente imaturas. É uma equação que não se resolve.
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Muitos são aqueles que conhecem os benefícios da meditação e se aventuram na prática. No entanto, a taxa de desistência ainda no início da jornada é expressiva, devido a necessidade de persistir e desenvolver habilidades para usufruir de resultados. Quais seriam então os passos que uma pessoa interessada em pacificar a mente deveria seguir, antes de, finalmente, fechar os olhos e se focar no momento presente?
Existem dados estatísticos demonstrando que, a cada 100 iniciantes, apenas 3 dão continuidade à prática. Isso se deve ao fato de que, quando nos deparamos com os muitos obstáculos mentais que certamente surgirão, o iniciante não conseguirá lidar com as diversas facetas da mente. Sendo assim, é fundamental que nos preparemos adequadamente, tanto no contexto filosófico, quanto no prático. Conhecermos o que é a mente, as relações entre sabedoria e ignorância e os estágios de desenvolvimento.
Meditação é uma ciência e, portanto, necessita de pesquisa e prática, com o devido aconselhamento. Não é uma metodologia que deve ser praticada livremente, sob o risco de trilharmos caminhos delusórios e voltados para o próprio umbigo. A meditação só produz valor agregado quando direcionada para o benefício de todos os seres. Meditar significa observar-se, aprimorar-se, visando o bem-estar geral. Quanto mais nos conhecemos, mais somos úteis aos outros. Nossos sentimentos aflitivos são exatamente os mesmos dos outros, apenas com variações de circunstâncias, intensidade e momento.
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Além da necessidade de aliar estudo e prática, existem tipos de meditação indicados e alinhados para determinadas personalidades e/ou propósitos de vida?
Nós deveríamos praticar meditação como filosofia de vida, como uma ferramenta de evolução pragmática e espiritual. Portanto, a meditação deveria ser um propósito de vida, praticada com estudos sobre o modo de funcionamento da mente, disciplina, firme determinação, resiliência, paciência, atenção plena e sabedoria. É fundamental entendermos que só adquirimos sabedoria com muito estudo e assiduidade prática e, por isso, é importante a interação com instrutores qualificados e experientes.
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Quando falamos em mentalidade de crescimento, nos referimos também a um momento em que o indivíduo tem um “insight” sobre a sua condição de vida, e decide fazer um movimento para alterar essa realidade? Práticas meditativas e exercícios de reflexão têm a capacidade de acelerar esse processo?
Mentalidade é a qualidade mental de um indivíduo. Necessitamos aprender a analisar a qualidade do nosso cotidiano, da nossa cultura. Aliás, cultura é o somatório da nossa ideologia comportamental, ou seja, crenças, intenções, valores e comportamentos. Infelizmente, nossa sociedade não nos ensina a focalizá-los, nem nos auxilia a determinar padrões culturais qualitativos. Há uma diferença latente entre o desenvolvimento científico e emocional. Estamos produzindo uma sociedade tecnicamente avançada e moderna, com mentes tecnicamente dispersas e altamente imaturas. É uma equação que não se resolve.
Só nos livramos do sofrimento quando entendemos suas causas e circunstâncias. Então, adquirimos o poder de cessá-lo.
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Um indivíduo precisa necessariamente ter um gatilho ou passar por determinada situação para começar a refletir sobre ressignificar a sua vida? Traumas e acontecimentos negativos também podem ser revertidos em um processo de autoavaliação e automotivação?
O propósito da vida é quando damos um sentido a ela. E isso passa pelas nossas experiências, que incluem ciclos de sofrimento e alegrias. Se estivermos atentos aos ciclos da vida e as respectivas oportunidades de aprendizado, vamos nos conscientizar que a realidade rude e insana mais transcende do que o otimismo falso e dissimulado. Só nos livramos do sofrimento quando entendemos suas causas e circunstâncias. Então, adquirimos o poder de cessá-lo. Por isso, a meditação é uma ciência, que deve ser praticada com a devida atenção.
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Com base no seu conhecimento, é comum que as pessoas se utilizem da máxima “eu sou assim” para justificar ações, padrões, pensamentos e até mesmo sentimentos? O senhor considera que essa afirmação possa servir como um mecanismo de defesa?
Hamlet, o famoso personagem escrito por William Shakespeare nos oferecia o virtuoso questionamento “To be or not to be, that is the question?” desde o século XVI e parece que ainda não aprendemos. Ser e estar não são a mesma coisa. Estamos num corpo físico tangível, que possui um caráter, temperamento e nome, contudo somos uma mente, absolutamente intangível, sem início, meio e fim. Há uma diferença essencial, porém não costumamos dar relevância a ela. Além disso, de forma muito grosseira, confundimos os significados de comum e normal, quando são coisas absolutamente distintas. O estado ignorante das coisas em pleno século XXI é comum, nunca normal, devido ao amplo volume de informações disponíveis. Vivemos numa espécie de bolha cognitiva, ilhados do contexto global, tentando nos defender de nós mesmos, sem nos questionar “Ser ou não ser: o que estamos fazendo? Para onde vamos? Na realidade, a ignorância está ganhando de goleada da sabedoria. A boa notícia é que este cenário é reversível. Basta termos VONTADE!
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E para finalizar a nossa conversa, uma pergunta que lhe deve ser recorrente, mas nunca deixará de ser pertinente, considerando a forma como o termo é vulgarmente atribuído: mas afinal, o que é ser zen?
Zen é o nome de uma Escola budista originária na China, da tradição Mahayana, que acabou se difundindo em diversos países, especialmente no Japão. É uma técnica baseada na transformação da visão sobre os fenômenos internos e externos, e se relaciona diretamente com o modo de funcionamento da mente. Uma pessoa “zen” zela pela diligência em relação aos venenos da mente, que nos assombram constantemente. Um praticante zen é consciente de suas limitações e suas virtudes, e procura viver a vida como uma forma de aperfeiçoamento, por meio da consciência, discernimento e disciplina.
Biografia
Wilsom Moura atua como strategic thinker, palestrante, mentor, astrólogo e escritor, com o propósito de projetar mentes de clara visão e estratégias de otimização pessoal e corporativa.
Formou-se em Engenharia mecânica e pós-graduou-se em Gestão pela qualidade total. Iniciou sua carreira profissional exercendo os cargos de Engenheiro e Diretor comercial. Foi convidado para trabalhar na França, onde atuou 4 anos como ‘Chef de produit’ e ‘Chef de marché’. De volta ao Brasil, criou sua própria empresa na área de Comércio exterior, dando início a um ciclo empreendedor. Realizou várias formações extracurriculares e profissionalizantes como ‘Comércio internacional’ em Paris, Sistemas de Gestão Integrada (SGI), Responsabilidade Social (SA8000), Advising, Mentoring, Professional Coaching & Astrologia.
A experiência cultural internacional e multidisciplinar adquirida em 29 países despertou o interesse pela qualidade humana. Visando ampliar suas competências sobre as diversas manifestações de inteligência e a pacificação da mente, participou de múltiplos cursos de Meditação, Yoga, Medicina tibetana, Seamm-Jasani, Feng Shui e Técnicas de respiração. Também efetuou um treinamento avançado de 90 dias na Índia e Nepal, convivendo com cinco mil monges tibetanos.
Realinhou sua atividade profissional em 2000 e, desde então, pesquisa frameworks, metodologias e melhores práticas, quando deduziu que o que realmente estava produzindo era a Arte da Engenharia. Engenharia de desempenho humano. Engenharia de vida. Uma clara visão de que a ciência possui uma natureza espiritual, transformando o engenheiro mecânico em engenheiro de vida.
Autor do livro ‘Fator Zen – Um Convite à Paz Interior’, além de outros artigos publicados em seu Blog.