Intolerância Religiosa: o que é e qual a religião mais atingida
Os registros de intolerância religiosa têm crescido no Brasil ano a ano, os novos casos prejudicam principalmente as religiões de matriz africana, como a Umbanda e o Candomblé. Entenda o que é a intolerância religiosa e porque ela tem que acabar.
800 casos de intolerância religiosa no RJ em 2017
Apenas no Estado do Rio de Janeiro foram registradas 800 ocorrências de intolerância religiosa no ano de 2017. 71,5% dos casos são contra religiões de origens africanas como Umbanda e Candomblé e os tipos de intolerância mais praticados são discriminação, depredação, difamação e invasão. Desde que esse tipo de denúncia passou a ser recebida por telefone em 2011, o número de casos só aumentou. Foram 15 em 2011, 109 casos em 2012 e em 2016 os números já alcançavam 749 casos. Todo tipo de intolerância religiosa é crime segundo a Lei 9.459 de 1997 e a pena varia de um mês a um ano de detenção ou multa, com agravante se houver violência física. O Rio de Janeiro é o estado com maior número de denúncias deste tipo de crime, seguido por Minas Gerais e São Paulo.
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O que é a intolerância religiosa?
A intolerância religiosa é quando alguém não aceita ou tolera a prática de outras religiões ou crenças diferentes da sua. A manifestação verbal ou física que impeça a manifestação de um tipo de credo é considerado crime, pois a lei protege a Liberdade Religiosa. Entretanto, muitos são os casos de injúrias, piadas, agressões, destruição de templos e patrimônios religiosos. Em alguns casos, a intolerância religiosa já chegou a fazer vítimas fatais no Brasil.
Por que as pessoas se tornam intolerantes?
Essa é uma questão complexa.
Questões históricas
Desde a Antiguidade existem casos de intolerância religiosa. Os primeiros Cristãos foram perseguidos pelos judeus e pelos pagãos. Na Idade Média, os judeus tornaram-se alvo de perseguição religiosa antes do fim do Império Romano. A perseguição religiosa atingiu níveis nunca vistos antes na História durante o século XX na Segunda Guerra Mundial, quando os nazistas perseguiram milhões de judeus e outras etnias indesejadas pelo regime. Atualmente, os casos mais comuns de perseguição religiosa no mundo são contra às religiões islâmicas.
No Brasil
O Brasil é o maior país católico do mundo, entretanto nem sempre foi assim. A religião cristã foi implantada com a colonização portuguesa, que decretou o Catolicismo como religião oficial e impediu outras manifestações religiosas. Os credos indígenas e africanos eram punidos e proibidos, gerando os primeiros registros de intolerância religiosa no nosso país. É por isso que existe o sincretismo religioso em religiões brasileiras e afro-brasileiras se formou, foi a forma que se encontrou para manifestar a sua fé, entenda essa questão clicando aqui.
Religiões maniqueístas
Muitos credos são maniqueístas, ou seja, que dividem o mundo entre o Bem e o Mau, Deus e o Diabo. Portanto, consideram “erradas” ou “pecaminosas” todas as religiões e credos que divergem dos seus ensinamentos. A maioria dessas religiões intolerantes fazem essa distinção como forma de perpetuar a sua crença e “eliminar o mal”.
Visão pejorativa de certos credos
A intolerância se baseia principalmente no combate ao mau, ao demônio, ao Diabo, àquilo que é considerado como a manifestação das trevas na terra. As religiões que cultuam as incorporações – como a Umbanda, Candomblé, Espiritismo e outras religiões protestantes – são as que mais sofrem esse tipo de preconceito, pois as incorporações são consideradas pelos intolerantes como manifestações do mau. As religiões de matriz africanas sofrem ainda com o culto a algumas entidades como Pombagira ou Exu, que são vistas como representações malignas por quem não conhece o credo.
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Como a intolerância religiosa se manifesta no Brasil?
De diferentes formas. Esses são casos reais que aconteceram no Brasil:
- Uma mãe de santo foi obrigada a destruir os seus objetos de fé sob a mira de um revolver;
- Frequentadores de terreiro foram alvejados por pedradas;
- Locais de culto de crenças afro-brasileiras invadidos e depredados;
- Protestos contra o uso de figuras de orixás no espaço público;
- Alunos sofrem bullying na escola dos colegas e professores ao demonstrar a sua fé;
- Repúdio ao ensino do papel das religiões de matriz africana na história do Brasil.
E muitos outros. Muitos crimes de ódio motivados por intolerância religiosa fizeram vítimas de agressões verbais e físicas que geram marcas eternas e isso precisa acabar.
Por que a intolerância religiosa tem que acabar?
Porque todas as pessoas têm a liberdade e o direito de acreditarem e seguirem a fé que desejarem. Ninguém pode fazer críticas pejorativas, discriminar, recriminar, fazer injúrias, agressões verbais ou físicas por causa da crença religiosa. Não existe uma religião certa ou errada, todos aqueles que buscam o bem e a luz, independentemente de sua religião, precisam ser respeitados. A falta de compreensão e respeito pelas religiões muitas vezes acaba em perseguição e crime de ódio, ferindo a liberdade e dignidade humana. A liberdade de culto é assegurada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Constituição Federal. No Brasil, a discriminação religiosa é crime desde 27 de dezembro de 2007, que garante a todos os brasileiros o “livre exercício de cultos religiosos e tendo garantida a proteção aos seus locais de culto e às suas liturgias”. O Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa é celebrado em 21 de janeiro no país.
Como acabar com a intolerância religiosa?
A educação e conscientização são as principais formas de combate à intolerância religiosa. É através do conhecimento da igualdade entre todos que a distinção de religião, raça ou gênero pode se dissolver. As leis protegem as vítimas deste tipo de crime, mas ele continua a acontecer, portanto mais do que proteger as vítimas é preciso a consciência de que todas as pessoas são livres para manifestar a sua fé, seja ela qual for.
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Por que a religiões de matriz africanas são as mais prejudicadas?
De acordo com o professor Vagner Gonçalves da Silva, antropólogo ligado à USP (Universidade de São Paulo) que estuda religiões afro-brasileiras isso acontece por motivações maniqueístas e de poder. Segundo Silva, apenas 3% da população brasileira se assume como seguidor de uma religião de matriz africana, enquanto a maior parte da população é cristã. A perseguição às religiões de matriz africanas é histórica e ela acontece porque a Umbanda ou o Candomblé, por exemplo, não possuem a força da Igreja Católica. “Basta lembrar o episódio de 1995 em que um bispo da Igreja Universal chutou uma imagem de Nossa Senhora de Aparecida, deu no que deu. Com Igreja Católica não se brinca, ela é muito forte”.
O maniqueísmo de “combate ao mau” também é um dos motivos. As incorporações e cultos às entidades fazem com que outras religiões tenham visões pejorativas das práticas africanas ou afro-brasileiras. “Quando o pastor mostra que é mais forte que o Exu, ele mostra que tem poder absoluto, inclusive de fazer com que uma entidade que toma conta de uma pessoa seja expulsa. É mostrar sua força por meio do ataque, de exemplificar o seu poder”, garante o professor.
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