Não é hora de festa! (Ou é?)
Esse texto foi escrito com todo o cuidado e carinho por um autor convidado. O conteúdo é da sua responsabilidade, não refletindo, necessariamente, a opinião do WeMystic Brasil.
Este mês de dezembro fez um ano que o primeiro caso oficial de coronavírus foi descoberto na China. Logo, estava nos Estados Unidos e Europa, e o negacionismo brasileiro já não acreditava que a doença chegaria no país. É muito quente aqui, diziam. Está muito longe, isso aí não chega aqui não, pensavam. Brasileiro é forte, vírus não se cria aqui.
Agora, em plena e clara segunda onda mundial, temos um cenário de fim da pandemia no Brasil. Enquanto a Europa se fecha, o Brasil vai à praia, faz festa, viaja e aglomera. E a chegada das festas de fim de ano mostram que parece mesmo que tudo já acabou: especialmente entre as classes mais altas, os planos para o fim de ano estão a todo vapor e os centros comerciais estão lotados. A economia agradece, mas chora o SUS e todas as milhares de famílias enlutadas. Eu abro as redes sociais, em especial o Instagram, e penso: mas que raios está acontecendo?
Rumo a mundo melhor (?)
Passamos anos ouvindo que estávamos em plena transição planetária e logo deixamos as trevas. Despertar da consciência, evolução espiritual e espiritualidade nunca estiveram tão em alta, e confesso que alguns anos atrás eu realmente achava que estávamos fazendo progressos. Quando a pandemia começou, cheguei a pensar que o mundo seria melhor depois dela. Agora, um ano depois e alguns milhões de mortos, já não penso mais assim. A cada dia que vejo as notícias, fico mais desanimada e indignada.
Os bares estão cheios, os restaurantes lotados, shoppings, centros comerciais e academias funcionam como se nada estivesse acontecendo e basta um feriadão para as praias brasileiras ficarem abarrotadas. A escola não, essas estão fechadas desde março. Lembro bem quando no início de tudo, uma influencer famosa sofreu uma onda de ódio após participar de um casamento e contrair covid, e, logo após sua recuperação, se encontrou com amigas em um apartamento. Realmente uma atitude irresponsável e egoísta, para dizer o mínimo. Agora, são várias influencers que promovem festas, chás de revelação, aniversários dos filhos “só para a família” e com testes de covid à porta. Como se elas não soubessem que testes rápidos não são seguros e que, após entrar em contato com o vírus, leva um tempo até qualquer teste positivar. Um desses influencers, que tem apenas 21 milhões de seguidores, deu uma festa de arromba com direito a shows, dj e muitos, mas muitos convidados. Claro, “todos fizeram teste”. Mesmo que isso desse, de fato, alguma segurança, gostaria de saber o que comemoram enquanto quase mil pessoas morrem no país todos os dias.
“Aquele que não conhece a verdade é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso”
Se poderíamos aprender alguma lição com isso tudo, que fizesse de nós não apenas pessoas melhores, mas uma sociedade melhor, falhamos. Falhamos terrivelmente. Em meu meio social, existem muitas pessoas “espiritualizadas”, que meditam, acreditam no poder dos cristais e se sentem verdadeiros messias. Por coincidência (ou não), são essas mesmas pessoas que dizem que as máscaras são uma focinheira fascista, que vivemos uma ditadura que pertence a uma nova ordem global, que cerceia os direitos de ir e vir das pessoas.
Como assim não podemos mais viajar? Não posso mais ir ao parque? E essa escola fechada? Na internet, partilham notícias de que a vacina vai mudar seu DNA, chamam o imunizante chinês de “vachina” e sentem que seu direito pessoal é mais importante que a coletividade. Uma espécie de terraplanismo permanente do pensamento, que chega a revirar o estômago. E claro, como todo ignorante, se sentem descobridores das grandes verdades do mundo. Só eles, os grandes sábios de internet, antivacinas, conspiradores, é que sacaram o que de fato está acontecendo. E nem um pio sobre os hospitais lotados, sobre as pessoas que estão passando fome, sobre as famílias que agora choram seus mortos. Não. O brado é contra o isolamento, as máscaras e vacinas. Mundo melhor? Duvido muito. Acho é que vamos sair ainda mais egoístas e ignorantes disso tudo. Uma pena que a seleção natural promovida pela pandemia não leve em conta o QI, pois, se levasse, ainda teríamos alguma vantagem nisso tudo.
Ah, o Natal…
Depois do ano que tivemos, compreendo que tenhamos uma vontade imensa de celebrar o Natal com quem mais amamos. De fazer aquela festa, abraçar todo mundo, juntar a parentada para comer um belo peru. Mas não podemos, simplesmente não podemos. E isso não entra na cabeça das pessoas, não entra. Como podem dizer que amam a família se estão dispostos a colocar essas pessoas em risco? Ainda se fosse só “os deles” que estivessem em risco, mas não é. Basta uma pessoa contaminada em uma ceia de Natal para que outras famílias estejam em risco. Você pode não morrer, mas minha mãe sim.
Era época de demonstrar o nosso amor, nosso cuidado com aqueles que mais amamos, e cuidado agora é manter distância, infelizmente. É difícil pra caramba, realmente é um desafio para um país tão católico e festeiro não reunir a parentada no Natal. Mas o que é um Natal comparado ao resto de nossas vidas? Se você quer que no Natal que vem toda sua família esteja presente, é bom que sua ceia não tenha mais que 5 pessoas. E não se fie em “cartilha de segurança” para o Natal. Isso não existe. Se algum convidado estiver infectado, os outros vão pegar. Ninguém come de máscara, certo? Distanciamento de 1 metro é controverso e quase impossível. Com álcool na roda, tudo complica ainda mais. O certo seria passar o Natal com as pessoas que moram com você e ponto. Sem chororô, sem argumentação barata, sem ignorância negacionista. Mas não é a realidade do Brasil e o preço virá em janeiro e fevereiro, com a alta de casos e o possível colapso da saúde.
Depois do Natal, reveillon e carnaval
Como se não bastasse aglomerar no Natal, o ano novo é mais uma grande chance de viajar, aglomerar e passar o vírus para o maior número de pessoas possível. As praias lotadas, a disputa por um espaço ao sol, restaurantes e bares bombando. Que alegria! Alegria de morte, só se for. Como se festejar adiantasse algo…
Isso tudo é muito triste. O vírus em si e a doença já são suficientes para desequilibrar a mente mesmo dos mais sãos. Mas ver a realidade das pessoas, quem são elas de verdade é uma luta à parte. Eu não ainda não perdi ninguém para o vírus, graças a deus. Mas as perdas sociais são incontáveis. Vejo bem agora, vejo além das máscaras. Sei quem não vai tomar vacina, sei quem se expõe e expõe outros ao contágio, sei quem não usa máscara, sei quem está viajando e festejando enquanto os cemitérios enchem e as UTI’s lotam. Dia após dia, diminui a lista de pessoas que vão fazer parte da minha vida no ano que vem e nos anos a seguir, e só posso agradecer por isso. A verdade dói, mas nos liberta. Antes só do que mal acompanhado, certo?
O Brasil parece a banda que tocava música enquanto o Titanic afundava. Melhor morrer ouvindo uma boa música, certo? E que venha o carnaval!
A alegria não pode morrer
Com isso concordo. Há que se fazer do limão, uma bela limonada sempre que possível. Tentar manter a alegria das festas de fim de ano, e até do carnaval faz parte da manutenção da nossa já fragilizada saúde mental. Não é porque eu não posso estar com toda minha família ou viajar, que preciso decretar o fim do Natal, ter um péssimo ano novo ou ficar deprimida no carnaval. A vida segue, ela sempre continua e a promessa de um amanhã melhor sempre vai existir.
“A esperança é o sonho do homem acordado”
A questão é fazer isso com responsabilidade, com a sensatez de quem compreende que estamos em meio de um pico na história dessa pandemia. É preciso esperança e criatividade para manter os laços e deixar o coração aquecido, enquanto o mundo enfrenta um momento tão trágico. Mas isso não significa ser irresponsável e nem muito menos ignorante e egoísta.
“É preciso ter o caos dentro de si para gerar uma estrela dançante”
Esperança é a última que morre, apesar da realidade apontar caminhos que nunca pensei que fossem possíveis para a nossa história. Talvez seja esse o plano espiritual… Atingir o mais fundo poço da ignorância humana, para que possamos ressurgir depois, melhorados. Quem sabe. O que se sabe é que não é hora de festa, é hora de ter esperança!
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