O guia definitivo para fazer o Trabalho das Sombras
Na psicoterapia baseada em Carl Jung, o primeiro passo para a ampliação da consciência é estabelecer contato com a persona e a sombra. Essa expansão também é essencial para a evolução espiritual e este é o motivo pelo qual precisamos fazer um trabalho das sombras. Simplesmente reconhecermos que usamos máscaras sociais, denominadas por Jung como personas, nos leva à ideia de que muitas coisas se escondem por trás delas. Elementos que aprendemos a ocultar devido à adaptação social. Os aspectos reprimidos em busca de aceitação, compõem o que é chamado de sombra.
Aquilo que foi reprimido e sacrificado não deixa de existir. A sombra continua fazendo parte de nossas vidas de forma inconsciente. Como o nosso ego fica mais confortável com a persona e a sombra mostra um lado oculto e sombrio, é através dela que devemos começar um trabalho de autoconhecimento. É preciso ter a consciência de que somos mais do que nos foi socialmente imposto, exigido ou escolhido por nós mesmos. Confrontar essas verdades nos faz iniciar o trabalho das sombras, revelando características, desejos e tendências que estavam ocultos.
Escondidos atrás de máscaras – você também?
Atrás de nossas máscaras sociais, temos uma parte ferida, impulsiva, triste e isolada, que tendemos a ignorar. Porém, a sombra pode ser uma fonte de riqueza emocional e entendê-la é um caminho para a cura. O trabalho das sombras é um meio para uma vida mais autêntica e gratificante. Reparar, crescer e se curar emocional e espiritualmente são alguns dos benefícios deste trabalho.
Essa prática nos ajuda a tornarmos inteiros novamente. Devemos ser proprietários de nossa sombra, em vez de reprimi-la ou evita-la, para então experimentarmos uma cura profunda. O processo pode ser assustador para muitas pessoas. Neste artigo, vamos dar detalhes de como realiza-lo.
É fácil e confortável focar no lado leve da vida. Porém, isso não nos permite atingir as profundezas do ser, não nos transforma em um nível central. Escolher o caminho mais fácil vai deixar você pendurado superficialmente em coisas banais e confusas que parecem boas, mas não promovem nenhum crescimento ou mudança. Explorar sua sombra o fará tocar nas profundezas do seu ser.
“Confrontar uma pessoa com sua própria sombra é mostrar-lhe sua própria luz”
Conheça seis formas de realizar o trabalho das sombras
Existem inúmeras técnicas e práticas de trabalho das sombras. A seguir, vamos mostrar algumas que podem te ajudar a começar.
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Observe as suas reações emocionais
Nesta técnica, você vai aprender que é possível ter poder sobre você mesmo. Vamos explicar! Para este trabalho das sombras você vai prestar muita atenção em tudo que te choca, perturba e secretamente te emociona. A essência deste trabalho é descobrir para o que você tem voltado sua vida inconsciente. O que destacamos como importante, seja bom ou ruim, diz muito sobre nós.
A nossa realidade pode estar naquilo ao que reagimos, que nos deixa angustiados e irritados, que revela informações essenciais sobre nós mesmos. Por exemplo, algumas pessoas se sentem muito incomodadas ao ficarem vulneráveis, impotentes ou fracas. Elas podem ter aversão ao assistir cenas de violência em filmes, em passeios de montanha-russa, ao falar em público entre outras situações que as deixem fora do controle.
Outras pessoas desenvolvem um complexo de culpa por terem uma educação religiosa. Elas se sentem indignas porque desde a infância foram influenciadas por pensamentos como “você é um pecador” ou “por sua culpa Jesus foi crucificado”. Por isso, elas secretamente sentem-se indignas. Sua mente sempre está à procura do que você fez de errado e você está acostumado a se sentir culpado, mas isso é destrutivo para o seu bem-estar.
Observar coisas que nos angustiam e reprimem é um ótimo exercício para lidar com compaixão, atenção e perdão às suas sombras. Ficar atento às suas reações emocionais vai ajudá-lo a descobrir como suas feridas o afetam todos os dias. Para prestar atenção às suas reações emocionais você precisa antes cultivar:
Autoconsciência: Sem ter consciência do que está sentindo, fazendo, pensando ou dizendo você não irá muito longe. Porém, se tiver certeza da sua autoconsciência ainda precisa abrir a sua mente.
Mentalidade aberta: É preciso ter coragem e vontade para observar tudo que for desconfortável e se perguntar o “por quê” desta sensação. Sejam quais forem as suas perturbações, choques, irritações e seus piores medos, é preciso estar atento e observar de perto.
É provável que você descubra padrões que emergem constantemente em sua vida. Por exemplo, pode ficar envergonhado ou indignado todas as vezes que o sexo aparecer em um filme. Isso pode representar uma repressão sexual ou crenças equivocadas que você adotou ao longo da sua vida. Ou você pode ter medo de ver a morte e pessoas mortas, o que pode demonstrar uma resistência à natureza da vida ou um trauma de infância. Você também pode sentir nojo de estilos de vida espirituais, sexuais e políticos, o que pode revelar um desejo oculto de participar deles.
Você deve estar perguntando como algo que te gera tanta repulsa pode fazer parte do seu ser. Pense por um momento, se você não desse importância a isso, por que te deixaria tão irritado? No momento em que você reage emocionalmente a algo, é quando demonstra o poder dessa coisa sobre você. Apenas o que não desperta emoções em nós não é importante. Observe ao que você responde e escute o que a sua sombra tem a dizer sobre isso.
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Expresse de forma artística o seu lado sombrio
A arte é a maneira mais elevada de se expressar e também é uma excelente forma de permitir a manifestação da sua sombra. Os psicólogos usam a arte-terapia para ajudar seus pacientes a explorar seu interior.
Inicie permitindo-se sentir ou se inspirar em qualquer emoção sombria que te pertence. Escolha um meio artístico que esteja ligado a você como lápis e caneta, giz de cera, aquarela, scrapbooking, acrílica, escultura etc. e desenhe aquilo que sente. Não é preciso se considerar um artista para usufruir deste trabalho com sombras, nem planejar o que vai criar. Apenas permita que suas mãos, lápis, caneta ou pincel falem. Quanto mais espontâneo for, melhor. A expressão artística revela muito sobre sua parte mais escura e obscura. O psicólogo Carl Jung usava mandalas em suas sessões de terapia com este fim.
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Comece um projeto
O ato de criar pode ser muito frustrante e dar origem a algumas das suas características mais sombrias como raiva, impaciência, competitividade e insegurança. Ao mesmo tempo, realizar um projeto também permite que você vivencie sentimentos de alegria e satisfação.
Caso você não possua um projeto pessoal – como escrever um livro, construir alguma coisa, aprender algo novo ou compor músicas – busque por qualquer coisa que gostaria de começar a fazer. Use sua autoconsciência e a exploração pessoal durante seu processo de criação e assim, vai recolher insights profundos sobre sua escuridão. Se questione constantemente “O que estou sentindo? Por que estou sentindo isso? ”. Observe suas fortes emoções que vão surgir durante o processo de criação, sejam boas ou más. Você provavelmente vai ficar surpreso com o que vai encontrar.
Por exemplo, uma pessoa que não se considera competitiva, pode ter essa certeza contestada ao realizar um projeto pessoal. A sombra interior vai se manifestar, permitindo que você se entenda mais profundamente.
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Faça um diário das sombras ou escreva uma história
A história de Faust, escrita por Goethe, é um dos trabalhos que melhor caracteriza o encontro de um ego com seu Eu sombrio. O enredo detalha a vida de um professor que se vê tão separado e oprimido pela sua sombra que quase chega ao suicídio, percebendo que a redenção do ego só é possível caso a sombra seja resgatada ao mesmo tempo.
Neste trabalho das sombras, você pode escrever uma história para projetar os seus elementos sombrios nos personagens. Esta é uma ótima forma de aprender mais sobre a escuridão interna. Se você não gostar de criar histórias, faça um diário para escrever sobre os elementos mais sombrios da sua natureza que podem aparecer ao longo do dia. Ler sobre seus pensamentos e emoções sombrias pode te ajudar a alcançar o equilíbrio necessário na vida, compreendendo os lados escuro e iluminado dentro de você.
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Faça um diálogo interno
O diálogo interno ou imaginação ativa, como Carl Jung expressou, é uma forma de conversar com sua sombra e aprender com ela. Este trabalho com sombras pode causar um pouco de ceticismo. Afinal, aprendemos que somente pessoas loucas falam consigo mesmas. Porém, o diálogo interno é muito usado na psicoterapia como uma forma de ajudar as pessoas a se comunicarem com as diversas subpersonalidades que possuem – e todos temos diferente faces e lados do nosso ego.
Um jeito prático de fazer o diálogo interno é sentar em um local tranquilo, fechar os olhos e sintonizar com o momento presente. Em seguida, pense em uma pergunta que deseja fazer à sua sombra e fale de forma silenciosa em sua mente. Espere alguns instantes e observe se você vê ou ouve alguma resposta. Registre todas as coisas que surgirem e reflita sobre elas. Você pode até manter uma conversa com sua sombra usando este método. Apenas precisa ter uma mentalidade aberta. Não temos como controlar o que será dito, apenas deixar fluir naturalmente. Você vai ficar surpreso com as respostas que receberá.
A visualização é outra forma interessante de manter um diálogo interno. Mentalize imagens de florestas escuras, buracos, cavernas, elas estarão representando seu inconsciente. Lembre-se de sempre entrar e sair da visualização da mesma forma. Por exemplo, se estiver andando por um caminho, volte pelo mesmo caminho. Ou, se abrir uma determinada porta, abra a mesma porta ao voltar para sua consciência. Essa prática vai te ajudar a entrar e sair facilmente de suas visualizações.
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A técnica do espelho
Da mesma forma que projetamos aspectos profundos e sombrios de nós mesmos em outras pessoas, também projetamos nossas características positivas e leves. Por exemplo, uma pessoa por se sentir atraída por outra que demonstra forte autoafirmação, sem perceber que essa é a qualidade que deseja para si mesma. Outro exemplo recorrente é o julgamento. Você já deve ter ouvido muitas vezes alguém dizer “ Ele/ela é tão crítico” e ironicamente, a própria pessoa que diz isso não percebe que ela mesma está sendo crítica, demonstrando sua própria natureza de julgamento.
A técnica do espelho é um processo de descoberta das próprias projeções. Para realiza-la, devemos ter uma abordagem consciente e honesta em relação ao mundo, precisamos estar prontos para adquirir aquilo que renegamos. Ser muito sincero consigo mesmo é difícil e requer prática. Porém, devemos ter a mentalidade de que as outras pessoas são nossos espelhos. Precisamos entender que aqueles que estão ao nosso redor servem como telas, sobre as quais projetamos nossos desejos e medos inconscientes.
Inicie a prática analisando seus pensamentos e sentimentos sobre as pessoas que convive. Observe os momentos em que você se sente emocionalmente afetado e pergunte a si mesmo: “eu estou projetando alguma coisa? ”. Lembre-se que também podemos projetar nossas próprias qualidades em outra pessoa que as possua. Os psicólogos se referem a isso como “projeção da realidade”. Por exemplo, podemos projetar nossa raiva em alguém que é realmente cheio de raiva. Ou nosso ciúme em uma pessoa que seja ciumenta.
Questione a si mesmo: “O que de fato é meu, deles ou nosso? ”. Nem todas as situações revelam uma projeção, mas é algo que acontece com frequência. Observe também coisas que você adora nos outros e descubra quais são as projeções ocultas.
A técnica de espelho vai te ajudar a lançar luz sobre as qualidades das sombras que foram rejeitadas, reprimidas ou deserdadas por você. Domine sua sombra para ter uma vida muito mais equilibrada.
Se você está em busca de uma cura real, o trabalho das sombras é uma forma diferente de experimentar uma transformação interior profunda. Lembre-se que aquilo que você internaliza é externalizado de uma forma ou de outra. É muito mais interessante você ter controle sobre isso.
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