A Rosacruz e a modernidade
Vivemos em uma democracia teológica, onde podemos ter contato com diversas formas de pensar a gênese humana. Muitas são as doutrinas, mas poucas possuem um cunho filosófico com a Rosacruz , um movimento filosófico e esotérico que já possui séculos de existência.
“Quem pensa pouco, erra muito”
A Rosacruz nasceu na europa, no século XVII, após a publicação de textos pelo místico Christian Rosenkreuz, personagem tido como fundador da Rosacruz e que ainda divide historiadores e estudiosos em relação a sua existência. Christian Rosenkreuz nasceu na Alemanha e teria crescido em uma família simples, mas que pôde proporcionar a ele uma boa formação intelectual, indo do grego, latim e hebraico até a magia.
Por volta de 1393, a história dá conta de uma viagem que Christian Rosenkreuz fez a Damasco, Egito e Marrocos, onde estudou com mestres das artes ocultas, onde, após ser curado de uma terrível doença por esses mestres árabes, ele decide difundir esses conhecimentos e funda então a Rosacruz .
Mas foi na Espanha que Christian Rosenkreuz de fato iniciou a fraternidade da Rosacruz. Lá se estabelece e consegue discípulos, os responsáveis pela redação dos textos iniciais da filosofia. Mais do que que a redação, formou-se ali uma irmandade que eles chamavam de a Casa Sancti Spiritus (Casa do Espírito Santo) onde, através da cura de doenças e do amparo daqueles que necessitavam de ajuda, desenvolveram essa rede de auxílio e conhecimento que tinha o objetivo de guiar futuros reis na condução dos destinos da humanidade.
Sobre a doutrina: uma das mais antiga fraternidades do mundo
A ordem Rosacruz é uma organização fraternal, internacional, de homens e mulheres, dedicada à pesquisa, estudo e aplicação prática das leis naturais e espirituais. O propósito da organização é permitir que todos vivam em harmonia com as forças cósmicas criadoras e construtivas, para atingir a saúde, a felicidade e a paz. É um grupo místico e filosófico espalhado por todo o planeta que tem como objetivo ensinar os membros sobre os mistérios do mundo e sobre nossa condição espiritual, através do autoconhecimento.
“Pensamento positivo, por si, não transforma; ao contrário, se muito rasteiro abobalha, bloqueia, obstrui e tolhe. Fantasiar que as coisas entrarão nos eixos e a vida dará uma guinada por conta de alguma fórmula livresca comum, é o mesmo que pintar a parede com tinta barata e esperar que se resolvam as infiltrações”
Assim como a Igreja Católica tem diversas ramificações, existem várias ordens e fraternidades Rosacruzes, que podem ter algumas diferenças na forma de transmitir os conhecimentos. Entretanto, todas têm o mesmo propósito de continuar o trabalho de Christian Rosenkreuz.
Os primeiros seguidores foram identificados como médicos, alquimistas, naturalistas, boticários, adivinhos, filósofos e homens das artes, que se dizem herdeiros de tradições antigas que remontam à alquimia medieval, ao gnosticismo, ao ocultismo, ao hermetismo no antigo Egito, à cabala e ao neoplatonismo. A ordem Rosacruz teve membros ilustres como Leonardo Da Vinci, Paracelso, Francis Bacon, Jacob Boehme, René Descartes, Baruch Spinoza, Gottfried von Leibniz, Isaac Newton, Benjamin Franklin, Thomas Jefferson, Erik Satie.
Como objetivo principal, os irmão da ordem Rosacruz defendem a fraternidade universal entre todos os homens, através do desenvolvimento suas potencialidades para tornarem-se melhores, mais sadios e felizes. O autoconhecimento é, segundo a ordem Rosa Cruz, o caminho para o conhecimento da nossa natureza espiritual e se dá através da profunda mudança dos paradigmas e crenças pessoais, hábitos, pensamentos e sentimentos, para o despertar da consciência e o aperfeiçoamento intelectual, psíquico e espiritual.
Além disso, a ordem é moderna, apesar de antiga: foi a primeira fraternidade a colocar a mulher em pé de igualdade com os homens, pois desde seu surgimento o sexo feminino gozou de todos os privilégios, incluindo o de cargos, iguais aos do sexo masculino dentro das instituições rosacrucianas. Em comparação às outras doutrinas de poder predominante masculino, a Rosacruz tem um papel importante na luta da igualdade feminina.
Monografias e práticas da Rosacruz
Os ensinamentos da Rosacruz se apresentam em forma de monografias, que são enviadas pelo correio aos membros uma vez a cada mês, para que os temas e ensinamentos sejam estudados.
“O reino da quietude que os sábios conquistam pela meditação é também conquistado pelos que praticam ações; sábio é aquele que compreende que essas duas coisas – a consciência mística e a ação prática – são uma só em sua essência”
Entre as práticas, temos a meditação, que oferece benefícios desde o nível físico, com técnicas específicas para reduzir o estresse e ampliar processos de cura, até os níveis mentais e espirituais, com técnicas que despertam a consciência objetiva, o subconsciente e a relação de cada ser com o Cosmo.
Simbologia: A rosa e a cruz
Desde tempos muito antigos, mesmo antes da morte de Cristo, a cruz era usada como símbolo místico. O homem primitivo, em seus primeiros cultos ao sol, o contemplava de braços abertos.
A rosa simboliza o ideal de beleza e delicadeza, a mulher, o princípio de fecundidade, a mãe natureza. A conjunção de ambos os símbolos é o encontro de duas forças geradoras, opostas, da natureza. É a soma do par de contrários que originam a criação, a união dos pólos masculino e feminino.
Assim, a cruz Rosacruz tem um significado filosófico e psicológico muito bonito e que traduz os ensinamentos da doutrina.
Ecologia Espiritual
A saúde do planeta recebe atenção especial na ordem Rosacruz. Os líderes defendem um posicionamento ético em relação ao meio ambiente, visando a preservação e a conscientização dos membros e até mesmo da sociedade em geral no que se refere à relação que estabelecemos com a natureza ao longo da história e da necessidade urgente de mudanças em nossos hábitos e práticas, para que seja possível preservar a Terra e a continuidade da vida no planeta.
“É triste pensar que a natureza fala e que o gênero humano não a ouve”
Conforme informações no site da AMORC, essa chamada para a tomada de consciência dos membros e da sociedade em geral está resumida no documento “Exortação Rosacruz para uma Ecologia Espiritual”, que deve ser lido e colocado em prática o quanto antes para uma nova consciência a nosso respeito e de nossa relação com a Mãe-Terra.
Poço Iniciático da Quinta da Regaleira em Portugal
Portugal é, sem dúvida, uma terra de encantos e muita história, especialmente para os brasileiros. Um país que guarda em sua história tantos mistérios e revelações sobre a história humana e que, no caso da Rosacruz, tem uma relação muito próxima.
A Quinta da Regaleira é uma construção que está envolta nessa aura mítica e histórica: uma galeria subterrânea, em Sintra, com uma escadaria em espiral, sustentada por colunas esculpidas que levam até o fundo de um poço. A escadaria é constituída por nove patamares separados por lanços de 15 degraus cada um, invocando referências à Divina Comédia de Dante Alighieri e que representam os 9 círculos do inferno, do paraíso, e purgatório. No fundo do poço está embutida, em mármore, uma rosa dos ventos sobre uma cruz templária, que é um emblema representando do topo para baixo, a lua, o sol, os elementos, e, simultaneamente, indicativo da Ordem Rosacruz.
O poço é considerado iniciático porque acredita-se que era usado em rituais de iniciação maçônicos. Além disso, a explicação do simbolismo dos mesmos nove patamares diz-se que poderá ser encontrada na obra Conceito Rosacruz do Cosmos, símbolo de unidade entre os planos superiores e inferiores. A simbologia do local está relacionada com a crença que a terra é o útero materno de onde provém a vida, também a sepultura para onde tudo voltará.
O poço está ligado por várias galerias ou túneis a outros pontos da Quinta, a Entrada dos Guardiães, o Lago da Cascata e o Poço Imperfeito. Estes túneis estão cobertos com pedra importada da orla marítima da região de Peniche, pedra que dá a sugestão de um mundo submerso.
A energia do local é muito forte e, sendo você membro da Rosacruz ou não, vale muito a pena conhecer.
No Túmulo de Christian Rosenkreutz
Fernando Pessoa escreveu um poema chamado “No Túmulo de Christian Rosenkreutz”, em uma altura de sua vida em que estava interessado pelo ocultismo e misticismo, chegando a fazer até consultas astrológicas. Os seus interesses na área se concentravam principalmente nas organizações da Maçonaria e da Rosacruz, que podemos ver refletidos no lindo poema:
I
Quando, despertos deste sono, a vida,
Soubermos o que somos, e o que foi
Essa queda até corpo, essa descida
Ate á noite que nos a Alma obstrui,Conheceremos pois toda a escondida
Verdade do que é tudo que há ou flui?
Não: nem na Alma livre é conhecida…
Nem Deus, que nos criou, em Si a incluiDeus é o Homem de outro Deus maior:
Adam Supremo, também teve Queda;
Também, como foi nosso Criador,Foi criado, e a Verdade lhe morreu…
De além o Abismo, Espírito Seu, Lha veda;
Aquém não há no Mundo, Corpo Seu.II
Mas antes era o Verbo, aqui perdido
Quando a Infinita Luz, já apagada,
Do Caos, chão do Ser, foi levantada
Em Sombra, e o Verbo ausente escurecido.Mas se a Alma sente a sua forma errada,
Em si que é Sombra, vê enfim luzido
O Verbo deste Mundo, humano e ungido,
Rosa Perfeita, em Deus crucificada.Então, senhores do limiar dos Céus,
Podemos ir buscar além de Deus
O Segredo do Mestre e o Bem profundo;Não só de aqui, mas já de nós, despertos,
No sangue atual de Cristo enfim libertos
Do a Deus que morre a geração do Mundo.III
Ah, mas aqui, onde irreais erramos,
Dormimos o que somos, e a verdade,
Inda que enfim em sonhos a vejamos,
Vemo-la, porque em sonho, em falsidade.Sombras buscando corpos, se os achamos
Como sentir a sua realidade?
Com mãos de sombra, Sombras, que tocamos?
Nosso toque é ausência e vacuidade.Quem desta Alma fechada nos liberta?
Sem ver, ouvimos para além da sala
De ser: mas como, aqui, a porta aberta?Calmo na falsa morte a nós exposto,
O Livro ocluso contra o peito posto,
Nosso Pai Rosaecruz conhece e cala.
Tocante, não? Como tudo que Pessoa escreve.
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