Superando o vício no celular com técnicas de mindfulness: sim, é possível
“Graças a tecnologia, tudo fica mais fácil, enquanto as pessoas ficam mais distantes a cada dia que passa”
No mundo acelerado em que vivemos, os smartphones são ferramentas úteis e convenientes, mas o uso excessivo deles pode nos trazer problemas. A dependência do smartphone é uma condição que muitas pessoas reconhecem, mas não mexem os pauzinhos para resolver. Com certeza você sabe que essa fixação não tem como lhe trazer benefícios. E talvez esteja notando algumas consequências práticas que o uso indiscriminado do celular tem sobre a sua saúde mental, relacionamentos e objetivos de vida, não é mesmo?
Algumas pessoas levam tempo para perceber que a relação que elas mantêm com o dispositivo é compulsiva; e essa demora é ainda mais considerável quando se trata de finalmente admitir o quão destrutivo esse hábito acaba se tornando para o bem-estar.
A boa notícia é que existem formas razoavelmente fáceis de superar o vício no telefone, e o grande segredo começa em simplesmente não lutar contra, mas aplicar técnicas de mindfulness à essa questão.
Neste artigo, você aprenderá a colocar em prática, ao longo de três semanas, alguns fundamentos da atenção plena. E ao final da leitura, você finalmente estará pronto para retomar o uso do seu smartphone de forma controlada e produtiva. Vamos começar?
Clique Aqui: Ritual de mindfulness para evitar o burnout
Reconhecendo o problema
Antes de mais nada, é importante que você reconheça o vício. Se tiver dificuldades para dar esse primeiro passo, comece analisando se o celular atrapalha você na hora de realizar determinada tarefa.
Os smartphones nos permitem fazer muitas coisas e com um único clique podemos nos conectar com o mundo, receber chamadas de qualquer lugar, nos informar, trabalhar, pedir um táxi, comida etc.
Você provavelmente usa seu celular logo que acorda, para verificar mensagens e notificações e também é a última coisa que olha antes de dormir. Você o leva para todos os lugares e até dorme com ele ao lado.
Não temos dúvidas que se trata de uma ferramenta muito útil, mas também pode ser viciante e trazer vários problemas. Devido a um esforço repetitivo, pode nos causar danos nos olhos, pescoço, costas, entre outros e até deteriorar a qualidade dos nossos relacionamentos interpessoais.
Quanto mais usamos a tecnologia, nossa empatia tende a diminuir mais. O grande paradoxo é que esses dispositivos que podem ser comunicar de forma instantânea, por longas distâncias, não têm o valor da comunicação direta e contato pessoal.
Sem termos contato face a face, principalmente quando nos comunicamos por mensagens de texto, não há contato emocional completo porque não existe a emoção dos gestos, linguagem corporal, tom de voz e a nossa consciência é afetada, criando confusão ou falsas interpretações.
Vamos supor que cozinhar é sua grande paixão. Você consegue preparar uma receita sem parar entre uma etapa e outra para checar notificações ou dar uma espiada nas redes sociais? Agora vamos imaginar um cenário que exige mais atenção: você está preenchendo seu imposto de renda. Consegue começar e terminar o que começou sem distrações?
Estar atentos ao momento presente, se tornou cada vez mais difícil. Estamos sempre checando o celular e nunca ficamos tranquilos.Isso gera problemas físicos e de comunicação, falta de empatia, dificuldade em aproveitar o momento presente, menos concentração, entre outros problemas. Por isso, se você identificou seu vício em celular, é interessante buscar a prática da atenção plena.
Se você usa seu telefone compulsivamente, apesar de saber que ele o prejudica, há uma boa chance de você estar lidando com um vício comportamental. E agora que resolvemos a questão do reconhecimento, vamos começar a ver como uma intervenção em mindfulness pode resolver o problema.
Encontrando metodologias úteis para superar a adição
Para muitas pessoas (para não dizer a maioria), qualquer dieta ou restrição que envolva privações muito rígidas pode ocasionar uma recaída ainda mais séria. Por exemplo, se alguém evitasse beber por duas semanas, possivelmente se daria permissão para festejar depois disso — bebendo o equivalente a todo o álcool “perdido”. O mesmo acontece com a comida. Depois de terminar com sucesso uma dieta rígida, muitos se permitem comer compulsivamente.
Por isso, para superar o vício por telefone, é necessário adotar uma abordagem diferente. Algo que lhe permita observar seu próprio comportamento e perceber experimentalmente (não apenas intelectualmente) que as coisas ficam melhores quando você não desiste.
O impacto do Mindfulness em resistir às tentações
Em estudo realizado com estudantes da Universidade de Utrecht, pesquisadores queriam verificar se a atenção plena afetaria ou não as escolhas alimentares desses indivíduos.
Para isso, os estudantes foram divididos em 2 grupos: um experimental e dois de controle. O grupo experimental passou por um curto treinamento de mindfulness, enquanto os outros dois passaram por um tipo diferente ou nenhum treinamento.
Durante as práticas de atenção plena, o grupo experimental recebeu várias imagens e foi instruído a observar as reações de suas mentes a elas. Algumas imagens despertavam atração, outras aversão, e algumas eram bastante neutras.
Os alunos foram instruídos a prestar atenção a essas sensações — e a reconhecer todas as respostas como eventos mentais temporários.
Depois, todos os participantes foram ao refeitório pedir o almoço. Os pesquisadores monitoraram suas escolhas alimentarem e observaram que os participantes do grupo experimental eram menos propensos a ceder às tentações de lanches e comidas não-saudáveis.
Talvez você esteja pensando: mas no quê isso tem a ver com vício em celular? Bom, em ambos os casos estamos lidando com tentações; então por que não aplicar a atenção plena também ao seu problema digital?
Terapia de Aceitação e Compromisso
Consistindo em uma terapia que faz uso da atenção como um de seus principais métodos, a abordagem da TAC se baseia em estar com suas experiências exatamente como elas são. Em particular, isso significa sentir o desconforto em vez de fugir dele.
Vamos supor que o seu uso compulsivo do celular tenha sido desencadeado por um desconforto mental e emocional que andou surgindo ao longo dos seus dias. Diante disso, já pensou se você aprendesse a sentir e “apreciar” esse desconforto exatamente como ele é, em vez de recorrer ao telefone para se distrair?
Quando você é capaz de estar completamente presente no aqui e agora, sem julgar ou afastar as experiências (pensamentos, sentimentos, emoções, sensações corporais etc.), você tem muito mais liberdade para tomar as medidas necessárias para agir.
Então vamos lá, antes de começarmos a ensinar os passos para se livrar do vício, comece a observar quando você usa o telefone e o que exatamente está classificado como “comportamento compulsivo” para você.
Superando o vício com mindfulness – dicas práticas
Com essas ideias para superar o vício em celular através da atenção plena, não estamos propondo que você pare de usar seu smartphone, pois todos precisamos dele para várias coisas. Porém, sugerimos que preste mais atenção para não ultrapassar limites e ter consequências negativas. Veja algumas dicas práticas a seguir:
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Observe o seu estado mental
A primeira coisa que deve ser feita para usar o método da atenção plena é observar a si mesmo. Faça uma análise cuidadosa, sem julgamentos, de como se sente quando usa o celular por um longo período, como fica seu corpo e como se sente emocionalmente. Veja se você pega o telefone porque precisa usá-lo para algo que importa, porque quer se distrair ou por um hábito mecânico incontrolável.
Observe como se sente quando uma pessoa que está ao seu lado usa o telefone sem prestar atenção em você e também o contrário, como se sente quando está com uma pessoa e verifica o celular a todo momento. Faça essas observações de forma imparcial, sem se julgar ou julgar os outros, apenas observe. Este é o primeiro passo para ter consciência das consequências desses atos e para adotar comportamentos que ajudem a melhorar seu vício em celular.
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Pratique a gratidão ao acordar
Se quando você acorda a primeira coisa que faz é verificar o celular, tente mudar isso. Comece criando uma lista de circunstâncias e pessoas que o ajudam a ser feliz. Agradeça a essas pessoas, situações, bens e muitas outras coisas que te favorecem, ao acordar.
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Faça uma “caminhada de meditação”
Todos os dias, em um momento da sua escolha, caminhe devagar e silenciosamente, observando a união da terra com seus pés (ou sapatos). Durante a caminhada meditativa, preste atenção à paisagem ao seu redor e ao seu mundo interior.
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Se conecte à natureza
Tente passar um tempo sozinho na natureza, pode ser em um parque perto da sua casa, mas não leve o celular. Sinta-se livre como os pássaros, árvores e toda a natureza ao seu redor. Preste atenção aos seus sentimentos durante o contato com a natureza.
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Encontre um grupo de amigos que se interesse por mindfulness
Nossa última dica é que você tente encontrar amigos que se interessem pela atenção plena. Um grupo que você possa se comunicar com frequência, meditar em conjunto de forma silenciosa, conversar sobre coisas da vida, sobre seus propósitos, energia, autoconhecimento e crescimento pessoal.
Com essas ideias para superar o vício em celular através da atenção plena, não estamos propondo que você pare de usar seu smartphone, pois todos precisamos dele para várias coisas. Porém, sugerimos que preste mais atenção para não ultrapassar limites e ter consequências negativas.
Plano prático para começar hoje mesmo
O mindfulness, também chamado de atenção plena, é um estado no qual se desenvolve a qualidade da atenção e empatia no momento presente. A partir do treinamento da atenção plena, aprendemos a notar pensamentos, sensações corporais e emoções que ocorrem, sem reagir de forma automática ou habitual.
Essa prática nos leva a encontrar melhores respostas e aprender a tomar decisões mais conscientes e funcionais, influenciando a forma como enfrentamos os desafios do dia a dia. Graças ao mindfulness, aprendemos a conhecer e gerenciar as nossas emoções e criamos um espaço mental, principalmente em situações estressantes ou difíceis. Mas por onde começar a praticar a atenção plena?
Semana 1: Reconhecendo o uso do telefone
Durante a primeira semana, não se force a mudar nada, apenas observe. Torne-se mais consciente desse uso; procure discernir o que é saudável, daquilo que é compulsão.
Geralmente, com um pouquinho de esforço, você consegue perceber intuitivamente essa diferença. E com base nisso, poderá acompanhar mais de perto o uso do telefone qualificado como compulsivo.
Como fazer
Use um caderninho ou aplicativo de notas para adicionar qualquer observação, por mais óbvia que seja. Tome nota dos usos do celular em situações como, por exemplo: entrar no ônibus, esperar na recepção do médico, fugir do desconforto em uma reunião de família, etc.
Talvez durante a primeira semana você já tenha dados concretos o suficiente para se apoiar, e então começará a perceber quando costuma recorrer ao celular. Observe quais são os apps que você costuma abrir, quanto tempo perde neles, e se você realmente os acessa de forma consciente.
Você provavelmente vai perceber que a maior parte do uso compulsivo é desencadeada por tédio, aborrecimento, ansiedade ou outros sentimentos desconfortáveis. Nessa primeira semana, perceba qual é o propósito por trás do seu comportamento.
Semana 2: observando intenções vs. comportamento real
Aqui nós iremos utilizar uma ferramenta chamada “análise funcional”. Ela baseia-se na noção de que qualquer comportamento humano, mesmo que pareça não fazer sentido, tem um objetivo por trás dele.
Talvez a essa altura você já suspeite que a função pretendida do uso compulsivo do celular seja aliviar o desconforto ou qualquer outra constatação que você tenha chegado. No entanto, agora você irá anotar quais são as funções reais do seu comportamento. Em outras palavras: os resultados calmantes ou qualquer outro que você estava esperando, realmente funcionavam?
Para organizar esse pensamento, uma sugestão é que você faça uma planilha com as seguintes informações:
- Tempo: anote a hora em que você pegou o celular;
- Sentimento ou pensamento doloroso: anote aquilo que estava sentindo no momento em que precisou recorrer ao celular;
- Motivo do uso: registre tudo o que você acessou no celular durante esse período;
- Efeito a curto prazo: analise se você se sentiu mais feliz, focado, criativo, ou se nada mudou depois que você desligou a tela do celular;
- Efeito a longo prazo: o sentimento/pensamento perdurou? Por quanto tempo? Registre tudo. Você pode usar uma escala de 0 para (o desconforto aprofundou) a 4 (o desconforto definitivamente diminuiu.
Nesta fase, procure analisar se você se sentiu bem em algum momento, e o que aconteceu para que isso ocorresse. Talvez você comece a reparar que as únicas vezes em que os efeitos foram positivos foram aquelas em que você se deparou com uma notificação positiva (recebeu um email te chamando para uma entrevista de emprego, o crush curtiu a sua foto, etc). E que em 90% dos casos, você não estava tão satisfeito assim com que que via — aprofundando ou estabilizando seu nível de desconforto.
Agora que você já tem uma visão mais clara sobre os motivos que o levam a olhar o celular, chegamos à fase mais crítica: como realmente resistir à tentação de dar uma espiadinha sem se sentir privado de algo?
Semana 3: 10 respirações conscientes
Você sabe que, se privar de algo, é um tiro que sai pela culatra hora ou outra. E você não quer repetir esse erro. Então é aqui que introduzimos novamente aquele estudo com os estudantes da Universidade de Utrecht.
No experimento, os pesquisadores demonstraram que a aplicação de mindfulness pouco antes de pedir comida diminuía as chances de que as pessoas fizessem escolhas pouco saudáveis de refeição. E é justamente isso que você deverá reproduzir durante a terceira semana.
Aqui é um período onde já é possível parar de rastrear seu comportamento. Apenas se comprometa com uma simples ação: sempre que sentir vontade de mexer no celular como uma forma de escapar do desconforto, respire de forma consciente por dez vezes.
Não se comprometa a não verificar as notificações posteriormente — isso envolveria controle e força de vontade. O único acordo aqui é fazer uma pausa durante dez respirações e observar como a tentação é sentida no seu corpo.
O que você esperar nesta fase
Você provavelmente terá uma incrível, e até mesmo milagrosa, resposta após as primeiras pausas de respiração. Para muitas pessoas, observar a tentação e completar as dez respirações têm a capacidade de eliminar completamente o desejo de olhar o celular. Se não complemente, pelo menos o torna mais vago.
Dedicar um tempo para dar total atenção ao seu desconforto pode ser capaz de mudar o curso do seu comportamento. Não apenas a vontade de verificar o dispositivo diminui, como a técnica também cria espaço para a tomada de decisões mais conscientes.
Às vezes, durante as dez respirações conscientes, você pode tentar imaginar como se sentiria se estivesse checando suas notificações. Talvez você perceba que isso provavelmente te deixará mais ansioso, entediado ou zangado, e desista de realmente pegar o celular.
A atenção plena, combinada com o conhecimento experimental de como o vício te afeta, lhe permitirá abandonar organicamente o comportamento compulsivo. Ou seja, a sensação é a de que você não está se privando de nada, pelo contrário. A visão de verificar as notificações constantemente começará a parecer um ato de privar-se da paz de espírito.
Clique Aqui: Trabalho respiratório: Como explorar o incrível poder da respiração
Semana 4 em diante: acompanhando o experimento
Talvez a partir do momento em que você já passou pelo frenesi do experimento, um certo temor em voltar facilmente aos velhos hábitos pode surgir. E se alguns impulsos começarem a aparecer depois de alguns dias do término dessa intervenção, não se preocupe.
Apenas mantenha-se no caminho do autocontrole e da atenção plena. Para isso, podemos sugerir algumas diretrizes que vão te ajudar no processo de relembrar seus principais aprendizados.
- Em caso de dúvida, conte as dez respirações conscientes, focando sempre no momento presente. Este simples ato pode alterar o curso do seu comportamento;
- Examine mentalmente a recompensa desse uso específico do telefone em relação aos seus contras. Lembre-se do efeito mais provável que isso terá sobre você. Realmente vale a pena?
- Fale sobre o experimento com outras pessoas sempre que puder. Expressar suas descobertas ajudará a reforçá-las em seu comportamento;
- Distancie-se do celular durante a noite — de preferência, pare de usar o dispositivo por volta das 18h. Isso garante que todos os dias haja um longo período em que você esteja longe do telefone;
- Reserve tempo para uma distração intencional. Esses são alguns “momentos de trapaça” ao longo do dia, quando você se distrai sem culpa. Dessa forma, os dispositivos não se tornam “os frutos proibidos”, o que poderia convidar tentações desnecessárias.
Estas são apenas algumas sugestões que podem te ajudar a manter o uso do celular sob controle. As suas diretrizes podem ser completamente diferentes, dependendo do que você descobrir em seu experimento. Lembre-se de que o ponto principal de criar essas regrinhas é lembrar-se dos aprendizados relacionados ao seu vício.
A cada nova semana, volte à lista e revise suas diretrizes, adicionando ou removendo o que achar necessário. Com o passar do tempo você verá que seu comportamento com relação ao celular se tornará mais natural, e mesmo que algumas “escorregadas” aconteçam, você desenvolverá uma maior consciência sobre seus atos e consequências.
De forma orgânica, os momentos conscientes surgirão com mais e mais frequência, e quase sem esforço algum, você conseguirá perceber quando o telefone está realmente te prejudicando, e naturalmente o colocará de lado — sem se sentir privado de nada.
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